Associação de Direito de Família e das Sucessões

UM NOVO PARADIGMA DE ALIMENTOS NA GUARDA COMPARTILHADA: ALIMENTOS COMPARTILHADOS

Esse artigo é de autoria de Danilo Porfírio de Castro Vieira, associado da ADFAS, e Paulo Roberto Costa dos Santos.

SUMÁRIO: Introdução. 1. Da guarda compartilhada e seus efeitos; 2. Os alimentos e a solidariedade familiar; 2.1. A obrigação alimentar e o poder alimentar; 3. A exoneração dos alimentos do menor em caso de guarda compartilhada; 3.1. Contra exoneração; 3.2 Pró-exoneração; 4. Análise de dados; Considerações Finais.

INTRODUÇÃO

A modalidade de guarda compartilhada foi inserida no ordenamento jurídico a partir da Lei 11.698/2008 e, posteriormente, alterada pela Lei 13.058/2014. Com a compulsoriedade desta modalidade de guarda, um dos questionamentos é sobre possibilidade de redução do valor da pensão alimentícia. Nessa senda, pretende-se analisar a possibilidade de mudança na fixação de alimentos, uma vez que com o advento da Lei 11.698/2008, também conhecida pela Lei da Guarda Compartilhada, e posteriormente alterada pela Lei n° 13.058/2014, surgiram várias discussões em relação à possibilidade de se pretender a fixação, a redução por compartilhamento dos alimentos destinados ao filho, tendo em vista que ele está sob a responsabilidade conjunta dos genitores, ainda que em lares e períodos diferentes.

A guarda compartilhada, que pressupõe conservar a continuidade e estabilidade da vida dos filhos, ou mitigar as inconveniências do desfazimento do lar, além da busca pela preservação da convivência com os pais, mantém também os custos e despesas ordinárias, anteriores à dissolução da relação entre os pais. Porém, a magistratura insiste em considerar a mensuração dos alimentos, como se a guarda fosse unilateral, no velho modelo da mãe cuidadora e do pai provedor, o que é incompatível com o novo paradigma de família.
Logo, é imperioso buscar novos caminhos de arbitramento dos alimentos considerando o trinômio necessidade, possibilidade e proporcionalidade, considerando ganhos e despesas dos genitores, que serão corresponsáveis pelos alimentos.

No primeiro momento serão abordados aspectos referentes à guarda, como o seu conceito, bem como as suas modalidades e seus efeitos, o poder familiar e a tutela. No segundo momento o instituto jurídico dos alimentos será o objeto de estudo, buscando a sua definição e a sua natureza jurídica, a obrigação alimentar e o dever alimentar. No terceiro momento será abordado o compartilhamento dos alimentos do menor em caso de guarda compartilhada.

1 – DA GUARDA COMPARTILHADA E SEUS EFEITOS

Para se expor sobre a guarda compartilhada é necessário apresentar os institutos referentes à guarda e suas espécies. O instituto abordado neste tópico é a guarda de pessoas, especificamente, no âmbito do direito da família, da guarda de crianças e adolescentes. Tal instituto faz com que nasça nas pessoas uma proteção aos que estão sob sua guarda, procurando mantê-los (CASABONERA, 2000, p. 44).

A palavra “guarda”, que vem do latim guardare, que significa proteção, conservação, amparo, é definida juridicamente como o conjunto de direitos e obrigações que se estabelece entre uma criança e/ou adolescente e seu guardião, objetivando o seu desenvolvimento pessoal e sua integração social. A guarda somente será exercida por quem tem o poder familiar ou a tutela do menor.

Vale aqui fazer uma distinção entre a “guarda” do Código Civil/Direito de Família e a “guarda” do Estatuto da Criança e do Adolescente. A primeira tem por causa o poder familiar, conforme preceitua o art. 1.583 da codificação civil, a saber:

Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada.
§1º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua ( art. 1.584, § 5 o ) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.

Já a segunda se refere à proteção da criança, conforme preconizado no art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente: “A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.”

O fato da guarda no Código Civil ter por causa o poder familiar, e a do estatuto a proteção da criança, não significa que existem duas guardas, pois o conteúdo da guarda é único: ter o menor em sua companhia, cuidado, convivência. Para Flávio Tartuce (2016), um outro argumento que diferencia “as guardas” é de que a guarda do estatuto pode não ser definitiva e a que decorre do poder familiar é perene e contínua.

A guarda não pode ser sinônimo de poder familiar e nem de tutela. Quem detém o poder familiar sobre a criança, nem sempre detém sua guarda. Isso é perceptível numa ocasião em que um casal se separa e a guarda é conferida a um genitor. Nesse caso, tanto o pai quanto a mãe permanecem possuidores do poder familiar, porém somente o genitor guardião detém a guarda.

Tal qual, nem sempre quem detém a guarda é o detentor do poder familiar, como ocorre com a guarda concedida a terceiros, perpetuando-se o poder familiar aos pais da criança e do adolescente.
O poder familiar se define em um conjunto de prerrogativas legais reconhecidas aos pais no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores, com vistas a criação, orientação e proteção. Ana Carolina Brochado Teixeira, assim expõe:

O antigo pátrio poder tinha como principal escopo a gerencia do patrimônio dos filhos, além de sobrelevar seu aspecto formal, de representação ou assistência dos menores para a prática de atos jurídicos. Sua essência era marcadamente patrimonial, pois o processo educacional não tinha tanto relevo, uma vez que se perfazia na autoridade paterna e no dever de obediência do filho. Essa ascendência era natural e inquestionada, além de ser fundamentada na desigualdade paterno-filial (TEIXEIRA, 2005, 128).

Atualmente, entende-se o poder familiar como um instrumento de contribuição para o desenvolvimento e ascensão da personalidade do menor, com intuito de fazer com que a sua criação seja ao máximo participativa, todavia pautada no respeito e no afeto.

Essa visão moderna da autoridade parental faz com que os pais estejam mais presentes na vida de seus filhos, mesmo que aqueles estejam separados e não haja uma boa relação entre eles (TAVARES DA SILVA, 2012).
A responsabilidade transcende o bom numerário da pensão alimentícia, pois se espera convívio, interação, atenção e responsabilidade, formação identitária, cidadã, transmissão de valores morais e éticos (RAMOS, 2016, p.44). A educação não se restringe ao zelo, mas no acompanhamento da instrução formal (escolar e profissional) e da sociabilidade da criança e do adolescente.

No que se refere à tutela, seu objetivo é fazer cumprir as funções daqueles que estariam exercendo o poder familiar – geralmente pai e/ou mãe. Nesse caso, a figura do tutor assume a representação ou assistência da criança ou do adolescente. Essa representação não é plena e ilimitada.

Essa proteção e o amparo de filhos ou menores é um pode-dever que tem o seu alicerce na lei, facultando a quem de direito, por considerar nessa condição, tais prerrogativas. A guarda, dessa forma, é um conjunto de direitos e deveres que certas pessoas exercem, por determinação legal, ou pelo juiz, de cuidado pessoal e educação de um menor de idade (OLIVEIRA, 1997, p. 53). Ela ainda consiste num complexo de direitos e deveres que uma pessoa ou um casal exerce em relação a uma criança ou adolescente.

Para Flávio Guimarães, a guarda consiste na mais ampla assistência à sua formação moral, educação, diversão e cuidados para com a saúde, bem como toda e qualquer diligência que se apresente necessária ao pleno desenvolvimento de suas potencialidades humanas, marcada pela necessária convivência sob o mesmo teto, implicando, até mesmo, na identidade de domicílio entre a criança e o(s) respectivo(s) titular(es) (CHAMBERS 2016, p.65).

A guarda, examinada sob a perspectiva do poder familiar, é tanto um dever como um direito dos pais: dever pois incumbe aos pais criar e educar os filhos, sob pena de deixarem o filho em abandono; direito no sentido dos pais participarem do crescimento dos filhos, orientá-los e os educar, exigindo-lhes obediência, podendo retê-los no lar, conservando-os junto a si, sendo indispensável a guarda para que possa ser exercida a vigilância, uma vez que o genitor é civilmente responsável pelos atos do filho (TAVARES DA SILVA, 2012).

Importante mencionar, que a expressão “guarda”, para alguns autores, tende a acabar, dando lugar à expressão “convivência familiar”. Maria Berenice Dias, ao citar Rodrigo da Cunha, faz a seguinte crítica: “Conforme observa Rodrigo da Cunha Pereira, a expressão guarda, por veicular um significante muito mais de objeto do que de sujeito, tende a desaparecer. Atualmente, de modo muito mais adequado, fala-se em convivência familiar” (DIAS, 2017, p. 547). Porém, se considerarmos a terminologia jurídica com maior acuidade, o termo convivência familiar está restrito a visitação, não sendo sinônimo de guarda, que abarca, além da convivência um série de deveres e atribuições por parte dos pais ou de terceiros, entre eles afeto, acolhimento e zelo, saúde, segurança e educação (TAVARES DA SILVA, 2012).

Quanto às suas modalidades hoje existentes no Brasil, de acordo com a codificação civil, temos a guarda unilateral e a guarda compartilhada, exercida por genitores ou terceiros (parentes ou não), quando a criança ou adolescente não recebe o cuidado de seus pais ou responsáveis. Quanto às guardas alternada, nidal e a atribuída a terceiros, estas não encontram previsão no ordenamento jurídico pátrio. Neste trabalho, far-se-á a abordagem conceitual das modalidades legais.

A guarda unilateral, exclusiva ou não dividida, é a tradicional no direito brasileiro. É aquela que um dos genitores detém a guarda, cabendo àquele que não a detém adimplir alimentos mensais, para fins de cooperação para a manutenção do filho.

O art. 1.583, parágrafo 1º da codificação civil preceitua que a guarda unilateral é atribuída a somente um dos genitores ou a quem o substitua, estando este guardião munido, não apenas da custódia física do menor, mas também do poder de decisão quanto às questões da vida (ROSA, 2015, p.55).

A deficiência dessa modalidade está no risco da perpetuação de uma situação de alienação parental, conforme o entendimento de Conrado Paulino da Rosa (2015, p. 56):

Mesmo com a nova previsão legislativa, comungamos do pensamento de que o promotor e o magistrado, utilizando, se necessário, da equipe interdisciplinar, devem investigar os motivos que levam esse genitor a manifestar seu desinteresse. Sabe-se que, cada vez mais, a órbita privada deve ser respeitada, mas, considerando a doutrina da proteção integral, mostra-se imperiosa a apuração das razões que levam um dos genitores optar por essa via. Tal postura evitaria, inclusive, a perpetuação de um quadro de alienação parental iniciado durante o período de união do casal, solidificado em sentença, determinando a guarda exercida de forma unilateral por um dos genitores (ROSA, 2015, p. 56).

A Lei 13.058/2014, nesse sentido, trouxe uma mudança significativa, alterando a aplicação do instituto da guarda unilateral para a forma excepcional. Tal mudança permitiu que muitos pais, que lutam para ter um convívio com seu filho, deixassem de ser meros visitantes.

Outra mudança significativa trazida pela nova Lei da Guarda Compartilhada foi de que o genitor não guardião possa participar na formação e demandas dos filhos, ficando a par do que ocorre com a criança.

O parágrafo 5º do artigo 1.583, do código civil de 2002 preceitua que a guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha supervisione os interesses dos filhos. Para tanto, “qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestações de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos” (ROSA, 2015, p.58).
Portanto, o estabelecimento da guarda unilateral ao detentor não dá a ele o poder de se abster de fornecer informações dos filhos ao outro genitor.

Já a expressão “guarda compartilhada” de crianças e adolescentes refere-se à possibilidade dos filhos de pais separados serem assistidos por ambos os pais (TAVARES DA SILVA, 2012). Nessa modalidade, os pais tem autoridade legal equivalente, não apenas para tomar decisões importantes, mas também quanto ao bem-estar de seus filhos. Essa modalidade foi inserida no ordenamento jurídico com a Lei n. 11.698/2008, modificando os artigos 1.583 e 1.584 do código civil (RAMOS, 2016, p. 44).

Vale ressaltar, que antes da alteração legislativa, a iniciativa já era vivenciada em muitos casais, sendo, inclusive, alvo de algumas decisões judiciais em vários Estados do Brasil, pois apesar de, anteriormente, não estar expressa, a legislação não proibia a sua aplicação.

Na codificação civil, a guarda compartilhada significa a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns (art. 1.583), de modo que o tempo de convívio com os filhos seja dividido de forma equilibrada entre mãe e pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos (§ 2º).

O sentido é, mesmo com o fim ou inexistência de um relacionamento afetivo entre os genitores, manter a unidade das relações familiares em favor do melhor interesse da criança e do adolescente.

Na busca pela definição de guarda compartilhada, dois conceitos parecem adequados: a guarda jurídica compartilhada (joint legal custody) e a guarda física compartilhada (joint legal custody).

No Direito norte-americano (CHAMBERS,2016, p. 44.), o termo joint legal custody (guarda jurídica compartilhada), refere-se à prerrogativa de tomar decisões em conjunto, o que significa que, mesmo em situações de divórcio, ambos os pais possuem o direito de tomar as decisões sobre o futuro dos filhos, embora a criança resida unicamente com um dos pais, que exerce a sua guarda física.

Antes do surgimento da primeira lei sobre a guarda compartilhada – Lei 11.698/2008 – a referida guarda já era notória pelo nosso ordenamento jurídico, pois no Brasil a separação e o divórcio não alteram os direitos e deveres advindos do poder familiar, conforme preceitua o art. 1.579 da codificação civil. A guarda jurídica compartilhada, bem como a guarda física compartilhada foram instituídas no ordenamento jurídico quando da alteração dos artigos 1.583 e 1.634 código civil de 2002, por meio da Lei 13.058/2014.

A alteração no art. 1.634, que versa sobre a autoridade parental, foi a inserção da expressão “qualquer que seja a situação conjugal dos pais”, assim consagrando a guarda jurídica compartilhada (RAMOS, 2016, p. 74).
Já a joint physical custody (guarda física compartilhada) é um arranjo para que ambos os pais possam estar o maior tempo possível com seus filhos, apresentando-se sob as mais diversas modalidades, nas quais a criança fica praticamente a metade de seu tempo com cada um deles.

A guarda física (ou material) compartilhada, posta no ordenamento jurídico por meio da Lei nº 11.698/2008, foi sedimentada no art. 1.583, § 2º, da codificação civil pela nova redação dada pela Lei nº 13.058/2014.
A referida guarda faz menção à necessidade de que o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada entre mãe e pai, independentemente do relacionamento que os pais mantenham entre si. Cabem a eles a proteção, a direção da criação e a educação dos filhos. E em caso de discordância, caberá ao Poder Judiciário definir a controvérsia, na forma que já estabelecida pelos arts. 21, do ECA e 1.631, parágrafo único, do Código Civil Brasileiro.

Destaca-se que a lei 11.698/2008, ao alterar artigo 1.584 da codificação civil reconhecendo guarda compartilhada, estabeleceu, em seu §2º, que “quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível”, deixando uma lacuna na lei e em alguns casos a jurisprudência entendeu não ser possível a aplicação do instituto da guarda compartilhada.

A situação supracitada, a título ilustrativo, é demonstrada na decisão proferida pelo TJ-SC de 2013:

DIREITO DE FAMÍLIA. MODIFICAÇÃO DE GUARDA E CONCOMITANTE EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. DEMANDA PROPOSTA PELO GENITOR CONTRA A GENITORA. ESTUDO SOCIAL REVELADOR DE SEREM AMBOS OS GENITORES APTOS A POSSUIR A GUARDA DO INFANTE. AUSÊNCIA DE FATOR DESABONADOR CAPAZ DE INVIABILIZAR A MANUTENÇÃO DE GUARDA, PELA MÃE, SOBRE O FILHO DE 12 (DOZE) ANOS DE IDADE. IMPOSSIBILIDADE, AINDA, DE CONCESSÃO DA GUARDA COMPARTILHADA, UMA VEZ QUE OS GENITORES NÃO POSSUEM UM CONVÍVIO PACÍFICO. OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. PEDIDOS INACOLHIDOS. GRATUIDADE JUDICIÁRIA NEGADA EM PRIMEIRO GRAU. MANTENÇA POR AUSENTE PROVA DA ALEGADA HIPOSSUFICIÊNCIA. MANUTENÇÃO, TAMBÉM, DO ESTIPÊNDIO ADVOCATÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.

Segundo a abalizada doutrina de Rolf Madaleno, “existindo sensíveis e inconciliáveis desavenças entre os pais, têm concluído os julgados e a doutrina não haver como encontrar lugar para uma pretensão judicial à guarda compartilhada apenas pela boa vontade e pela autoridade do julgador, quando ausente a boa e consciente vontade dos pais” (Curso de Direito de Família. 4. Ed. Rev., atual. eampl. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 433-434). (TJ-SC – AC: 20130294119 SC 2013.029411-9 (Acórdão), Relator: Eládio Torret Rocha, Data de Julgamento: 19/06/2013, Quarta Câmara de Direito Civil Julgado, Data de Publicação: 01/07/2013 às 08:14. Publicado Edital de Assinatura de Acórdãos Inteiro teor Nº Edital: 6205/13 Nº DJe: Disponibilizado no Diário de Justiça Eletrônico Edição n. 1661 – www.tjsc.jus.br)

Essa controvérsia da lei anterior, no entanto, foi abrandada com o advento da Lei 13.058/2014, que menciona expressamente a importância do equilíbrio do tempo de convívio entre os genitores, por intermédio da guarda compartilhada.

Para Waldyr Grisard, a obrigatoriedade da guarda compartilhada é uma questão antiga:

Há muito, a doutrina defende ser este o modelo que melhor atendia ao interesse dos filhos e, ouvindo-a, a Lei 11.698/08 alterou o art. 1.584, § 2º, do Código Civil, para estabelecer que a guarda compartilhada fosse aplicada ‘sempre que possível’. Ante a inobservância desta preferência legal pelos tribunais, que fixavam menos de 8% das guardas de forma compartilhada, sobreveio a Lei 13.058/14, alterando novamente o citado § 2º, para determinar que ‘quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, (…) será aplicada a guarda compartilhada (GRISARD, 2013).

Grisard reitera que o comando legal é imperativo, cogente e obrigatório. Para ele, o Código Civil estabelece que o melhor interesse dos filhos está na guarda compartilhada, de modo que apenas com prova contrária, demonstrando que o modelo é prejudicial aos filhos, poderá deixar o juiz de estabelecer o compartilhamento da guarda. O STJ reconhece que a guarda compartilhada é regra no sistema brasileiro”.
Assim se posicionou o STJ:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA REGRA DO SISTEMA. ART 1.584, § 2º DO CÓDIGO CIVIL. CONSENSO DOS GENITORES. DESNECESSIDADE. ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIA DA CRIANÇA. POSSIBILIDADE. MELHOR INTERESSE DO MENOR.
1. A instituição da guarda compartilhada de filho não se sujeita à transigência dos genitores ou à existência de naturais desavenças entre cônjuges separados.
2. A guarda compartilhada é a regra no ordenamento jurídico brasileiro, conforme disposto no art. 1.584 do Código Civil, fase da redação estabelecida pelas Leis nºs 11.698/2008 e 13.058/2014, ressalvadas eventuais peculiaridades do caso concreto aptas a inviabilizar a sua implementação, porquanto às é concedida a possibilidade de demonstrar a existência de impedimento insuperável ao seu exercício, o que não ocorreu na hipótese dos autos.
3. Recurso especial provido. (REsp. nº 1.591.161/SE, Relator Ministro Ricardo Villas Boas Cueva).

Por fim, considerando que a guarda compartilhada propicia à criança ou ao adolescente o exercício do poder familiar com a maior amplitude possível (FARIAS, 2016, p. 688), tanto nos casos em que há consenso quanto nos casos em que há litígio, a legislação brasileira a consagrou como regra a ser aplicada.

2 – OS ALIMENTOS E A SOLIDARIEDADE FAMILIAR

Desde sua concepção, o ser humano é carente por excelência, eis que não possui a capacidade congênita de produzir os meios necessários à própria subsistência.

Nesse contexto, os alimentos representam verdadeira condição de vida e, como tal, revestem-se de grande expressividade para o Direito. A Súmula nº 277 do STJ, a qual prevê que “julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir da citação”. Nessa linha de reflexão, é possível entender por alimentos o conjunto de meios materiais necessários para a existência das pessoas, sob o ponto de vista físico, psíquico e intelectual.

2.1 A obrigação alimentar e o dever alimentar

Para fins didáticos, deve-se promover inicialmente a distinção entre obrigação alimentar e dever alimentar.
A obrigação alimentar ou obrigação de sustento (de manutenção), refere-se à fixação de alimentos com base no poder familiar imposto, de maneira irrestrita aos pais (biológicos ou afetivos). E por se fundar no poder familiar, é ilimitada. Já o dever alimentar ou de prestar alimentos, é obrigação recíproca entre cônjuges, companheiros, parceiros homoafetivos e entre os demais parentes – não sendo pai e filho, em linha reta ou colateral, exprimindo a solidariedade familiar existente entre eles (FARIAS, 2016, p. 728-729).

Os sujeitos obrigados ao pagamento da prestação alimentar são determinados conforme o fato gerador de tal obrigação. Essa obrigação da prestação alimentar está ligada a duas situações colocadas pela codificação civil no art. 1.695, quais sejam: necessidade do alimentando e capacidade do alimentante. E, também, no critério da razoabilidade ou proporcionalidade, preceituado no art. 1.694, § 1°, da codificação civil, a saber: “Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.”

O dever à prestação dos alimentos funda-se na solidariedade humana e econômica que deve existir entre os membros da família ou parentes.

A obrigação alimentar, referente aos filhos menores de idade, oriunda do poder familiar. Os filhos, enquanto menores, estão sujeitos ao poder familiar, cabendo aos pais dirigir-lhes a criação e a educação. A codificação civil em seu art. 1.566, inciso IV, bem como o Estatuto da Criança e do adolescente, em seu artigo 22, dispõem que a ambos os pais compete o dever de sustentar os filhos.

Fica clara a preocupação do legislador em conceder aos filhos infantes e adolescentes o direito de serem alimentados pelos pais. E esse sustento não se limita apenas a subsistência material, mas também o apoio moral e intelectual ao menor. Vale assinalar que aos alimentos devidos aos filhos menores, como obrigação inerente ao poder familiar, aplicam-se as regras básicas previstas em lei para os alimentos em geral.

E essa obrigação decorrente do poder familiar, que antes era um instrumento de dominação dos pais sobre os filhos, hoje representa um instrumento de proteção, sendo parte de um conjunto complexo de direitos e deveres, decorrentes da paternidade/maternidade. Releva, ainda, anotar que essa missão que tem os pais de prestar alimentos aos filhos, como obrigação inerente ao poder familiar, subsiste mesmo que aqueles venham a ser do referido poder suspensos ou destituídos por decisão judicial.

Além disso, em se tratando de alimentos devidos a filhos, em que a obrigação se funda no dever de sustento, derivado do poder familiar, a obrigação é devida ainda que em fase da carência econômica dos pais (ou avós), não podendo tais devedores alegar impossibilidade financeira ou mesmo desemprego. A obrigação persistirá, ainda que não cumprida.

Cabe salientar que a pessoa obrigada a prestar os alimentos também pode pedi-los, pois o direito à prestação de alimentos é recíproco entre as pessoas definidas em lei.

Devemos relembrar que tanto na guarda alternada , quanto na guarda unilateral, é comum a aquele que não possui a custódia o cabimento do dever de alimentar.

Ao lado dessas considerações, é de se dar realce a um fato digno de referências. É que, quanto ao recebimento dos alimentos, tanto na guarda alternada, quanto na sua modificação para a guarda compartilhada, caberá a prestação a quem não possui o lar referencial. Entretanto fica a dúvida: Na guarda compartilhada, a responsabilidade dos alimentos seria de ambos os genitores ou apenas de um dos cônjuges/companheiros?

3 – A IMPOSSIBILIDADE DE EXONERAÇÃO DOS ALIMENTOS E SUA PARTILHA EM CASO DE GUARDA COMPARTILHADA

Não são raras as dúvidas e questionamentos, sobre o direito a alimentos, nos casos em que os pais compartilhem a guarda da criança.

Muitos são os casos de alimentantes que pagam alimentos aos filhos e resolvem ingressar com ação para mudança da guarda unilateral para compartilhada, acreditando que esta mudança o exonerará do dever de prestar alimentos.
A guarda compartilhada, por si só, não afasta a obrigação alimentar, principalmente quando o lar de referência não é o do alimentante. Mesmo porque a Lei 13.058/2014 em momento algum versa sobre a exoneração de alimentos ou modifica a sua aplicação.

O compartilhamento da guarda não elimina a obrigação alimentícia dos pais, que continuam obrigados a colaborar materialmente para o sustento da prole, proporcionalmente à sua capacidade contributiva e considerados os gastos comuns necessários daquele com quem o filho estiver residindo (FARIAS, p.692).

Desta forma, a legislação faz entender que a ambos os genitores deverá ser resguardado períodos semelhantes de contato com o filho. Fato é, que nesse entendimento, muitos passaram a acreditar que com a repartição isonômica de tempo a consequência seria de que no período em que cada genitor passa com o menor aquele fica responsável pelas despesas deste e, portanto, haveria a desobrigação quanto aos alimentos.

Em seu artigo Brunna Groth cita José Carlos Teixeira Giorgis, que assim fala sobre o assunto:
Nada mais equivocado, pois a obrigação persiste, nada significando o exercício conjunto dos direitos e deveres inerentes ao poder familiar, tanto que a jurisprudência afirma que a guarda compartilhada não significa exoneração da pensão. O fato de o genitor não guardião e provedor agora partilhar também dos cuidados das tarefas de criação, assistência e educação, não o afasta da responsabilidade de contribuir com o valor combinado para a mantença do credor, embora nada obste que a harmonia agora existente contribua para nova engenharia das obrigações dos pais (GROTH, 2016, s. p.).

Deve-se observar que a divisão de despesa igualitariamente torna-se impossível quando os dois pais não recebem os mesmos ingressos, pois tais despesas possuem dimensões distintas. Assim, existindo uma superioridade de recursos de um genitor em relação ao outro, há que se manter os alimentos.

Imperioso dizer que, sempre deve ser levado em conta o trinômio necessidade/possibilidade/proporcionalidade para essa situação.

3.1 Contra a possibilidade de exoneração

A obrigação de alimentar obsta a possibilidade jurídica de exoneração de alimentos na guarda compartilhada. Embora seja igualmente evidente que o tempo de permanência de um filho com um dos genitores, ou a convivência habitual influencie na contribuição do alimentante, estabelecendo uma repartição pontual e equitativa dos custos domésticos, mas primando pela proporcionalidade, para se evitar distorções.

Nessa esteira, é de se asseverar que existe um posicionamento jurisprudencial exaustivo em se negar provimento ao pedido de exoneração de alimentos, quando a alegação se baseia na guarda compartilhada. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, por meio do Acórdão 1030272, entendeu que a guarda compartilhada, por si só, não afasta a obrigação alimentar:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ALIMENTOS. BINÔMIO NECESSIDADE-POSSIBILIDADE. REVISÃO DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE ALIMENTOS. GUARDA COMPARTILHADA. CIRCUNSTÂNCIAS SUPERVENIENTES. REDUÇÃO DA CAPACIDADE FINANCEIRA DO ALIMENTANTE NÃO DEMONSTRADA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. A guarda compartilhada, por si só, não é óbice para o pagamento de pensão alimentícia. Precedentes desta Corte. 2. A fixação da pensão alimentícia se norteia pelo binômio necessidade-capacidade, obedecida uma análise das condições econômicas de ambas as partes, de forma a se estabelecer um valor que atenda satisfatoriamente às necessidades existenciais do alimentando, sem que isso importe ônus excessivo ao alimentante. Admite-se, ainda, alteração no valor fixado caso haja rompimento do equilíbrio necessário entre os fatores integrantes do referido critério.3. Somente circunstâncias supervenientes à fixação inicial dos alimentos são aptas a autorizar a revisão da obrigação alimentícia, de acordo com o disposto no artigo 1.699 do Código Civil.4. Apelação conhecida e desprovida (Acórdão n.1030272, 20160710058013APC, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA 7ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 05/07/2017, Publicado no DJE: 11/07/2017. Pág.: 406-415)

Há, nestes termos, uma inevitabilidade de prestação dos alimentos dos genitores para com os infantes, alicerçado no binômio necessidade/possibilidade.

Caso exemplificativo ocorreu no Tribunal de Justiça do Pará, onde houve o indeferimento do pedido de exoneração de pensão alimentícia de um pai, por entender que o Alimentante só estava movendo a ação de Guarda Compartilhada para se ver livre da obrigação de prestar alimentos.

[…] Merece destacar, nesse sentido, que o genitor deseja obter a guarda compartilhada e com ela a sua exoneração do pagamento da pensão alimentícia, conforme bem ressaltou em suas razões recursais nas fls. 276 assim, deferindo-se a guarda compartilhada, requer seja o requerido exonerado da pensão alimentícia fixada em sentença, se comprometendo o apelante a pagar o valor referente às despesas escolares do filho (escola particular), conforme declaração de fls. 60, e despesas pessoais (alimentação, vestimentas e lazer) enquanto estiver em sua companhia. Tal fundamento não deve prosperar, pois o que se identifica é a pretensão do pai em ter a guarda compartilhada para se desobrigar com o seu dever de pagar a verba alimentar, portanto, deve ser indeferido o pedido (TJ-PA – APL: 00058515020118140040 Belém, Relator: Ezilda Pastana Mutran. Data de Julgamento: 23/06/2016, 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Data de Publicação: 23/06/2016).

Percebe-se, que independentemente de onde a criança esteja, esses valores são devidos eis que a necessidade dos filhos menores é presumida.

3.2 Defesa da mitigação ou partilha de Alimentos?

Ao analisar o instituto da guarda compartilhada, é perceptível que, conforme estudado anteriormente, a obrigação do débito alimentar continua intacta, independentemente do modelo de guarda adotado.

Porém, faz-se uma crítica à jurisprudência, pois ao ser aplicado o instituto da guarda compartilhada, não houve uma mudança de postura de sua parte quanto a atribuição e quantificação dos alimentos. Na jurisprudência atual, há a compreensão de compartilhamento de guarda, sem que haja um compartilhamento de alimentos. O cálculo dos alimentos simplesmente se funda na necessidade do filho e na possibilidade do genitor que não possui o lar de fixação, mantendo-se, assim, uma postura conservadora, o que onera uma das partes.

Não se defende a exoneração total dos alimentos, mas sim uma mitigação, uma partilha, uma solidariedade nos alimentos, pois aquele que não possui o lar referencial não pode ser incumbido integralmente do dever de alimentos, pois a guarda compartilhada pressupõe corresponsabilidades.

Há situações, inclusive, em que os alimentos não necessariamente deveriam persistir. É o caso em que havendo dois filhos, cuja guarda seja compartilhada, cada um fixe residência com um dos genitores.

Insistindo, considerando que na guarda compartilhada há maior participação dos genitores, inclusive nas despesas cotidianas, existindo equiparação econômico-financeira e corresponsabilidade no sustento dos filhos, é possível a desobrigação unilateral e a devida partilha do dever de alimentos. Será levado em conta o princípio da proporcionalidade e o da igualdade de direitos e deveres entre homens e mulheres.

É bem verdade que a guarda compartilhada não afasta a obrigação alimentar. Todavia, quem não possui o lar de referência, possui, além da responsabilidade específica, a obrigação de prestar alimentos.

Ora, na guarda unilateral, o genitor que não tem a guarda deverá contribuir para o sustento do menor prestando alimentos. Porém, mesmo com a mudança do paradigma da guarda para compartilhada, a contabilização da responsabilidade dos alimentos continua como se guarda unilateral fosse.

Com a mudança do paradigma da guarda compartilhada, conforme tratado em tópicos anteriores, percebe-se um ponto no mínimo contraditório e incongruente: Na guarda compartilhada se pressupõe uma partilha de responsabilidades, inclusive alimentares. Porém, o que se observa na jurisprudência é um reconhecimento desse instituto, mas que se estabelece àquele que não possui o lar de referência o ônus dos alimentos como se trata na guarda unilateral. Ou seja, quem não possui o lar referencial continua tendo o ônus e carregando sobrecarga.

Entende-se que deve ser criado um parâmetro de cálculo de alimentos, no qual ambos os genitores sejam responsáveis pelos alimentos, dentro do trinômio possibilidade, necessidade e proporcionalidade. O fato é que o pai/mãe que não possui o lar referencial não pode ser sobrecarregado.

O que deve ser estabelecido, na verdade, dentro do trinômio “necessidade, possibilidade e proporcionalidade”, é que a fixação de alimentos não pode ser unilateral para quem não detém o lar referencial. Isto porque, a guarda compartilhada é uma tentativa de continuidade de uma relação familiar voltada para o filho, mesmo que o relacionamento afetivo do casal tenha terminado.

A superação de um modelo tradicionalista unilateralista, de conotações inclusive chauvinistas (por ainda trata o pai, em regra, como provedor e que mantem o lar de fixação para mãe), acontecerá por meio de uma nova disposição do trinômio.

Primeiramente, devem-se contabilizar as necessidades da criança e adolescente, quantificar monetariamente seu custeio integral. Posteriormente, devem-se identificar as possibilidades econômicas dos genitores, para, ao fim, partilhar por razoabilidade/proporcionalidade, estabelecendo critérios comparativos de ganhos e gastos entre os pais, o valor dos alimentos (converter o valor em percentagem dentro do rendimento /despesas de ambos).
Seria o mais justo, diante do paradigma de guarda compartilhada, que visa perpetuar a relação familiar, mesmo com o fim e o relacionamento afetivo entre os genitores. A família persiste, com seus deveres e direitos solidários.

4 – RESISTÊNCIA NA APLICAÇÃO DE COMPARTILHAMENTO DE ALIMENTOS NO TJDFT

Consideraram-se como objeto de análise judicativo, as decisões do TJDFT sobre a partilha de alimentos diante da guarda compartilhada. Trata-se de jurisdição da capital da república, alinhando-se com os posicionamentos dos tribunais superiores, sendo referência a para outros tribunais estaduais da região centro-oeste, norte e até nordeste. É também um tribunal conhecido pelo recepcionamento das teses contemporâneas de Direito de Família, como o reconhecimento da filiação socioafetiva, a multiparentalidade e paralelismo relacional.

Porém, ainda se mantém um posicionamento conservador de unilateralidade nos alimentos, sem a apuração dos gastos e rendimentos do genitor que possui o lar de fixação. Ainda se mantém majoritariamente o ônus unilateral do genitor que não possui o lar de fixação, com mais um detalhe, a prevalência do critério de gênero e o mito do zelo materno.
Sobre a mitigação e partilha de alimentos, somente foi encontrado duas decisões sensíveis ao objeto da pesquisa, o que evidencia o conservadorismo sobre a atribuição dos deveres alimentares.
No processo de nº 0042379-82.2013.8.07.0016 percebe-se que o uso do instrumento da guarda compartilhada proporciona um equilíbrio financeiro para ambos os genitores, permitindo que um ajuste nas atribuições de criação e educação dos filhos sejam isonomicamente partilhadas, dispensando-se assim, a fixação de alimentos em percentual de ganhos para suprir despesas extras.

DIREITO CIVIL E DE FAMÍLIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ALIMENTOS. GUARDA COMPARTILHADA. DIVISÃO IGUALITÁRIA DAS DESPESAS ENTRE OS GENITORES. ALIMENTOS EM PECÚNICA NÃO DEVIDOS PELO PAI.
1. A guarda compartilhada representa moderno instrumento voltado ao fortalecimento da convivência familiar e, sobretudo, ao desenvolvimento da criança num ambiente de solidariedade, cooperação e harmonia.
2. É possível o compartilhamento de guarda quando há suficiente diálogo e cordialidade no relacionamento dos genitores.
3. Nos casos em que os pais ajustaram que as atribuições de criação e educação dos filhos serão igualmente compartilhadas, não é necessário a fixação de alimentos em percentual de rendimentos para fazer frente às despesas extras, sendo bastante que cada qual apresente os comprovantes da quantia a ser rateada.
4. Apelação conhecida e provida. Preliminar rejeitada. Unânime (Acórdão n.902557, Relatora: FÁTIMA RAFAEL 3ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 21/10/2015, Publicado no DJE: 29/10/2015. Pág.: 191).

No processo 0700068-07.2018.8.07.0001, o magistrado decidiu por reduzir o percentual dos alimentos, pois entendeu, dentre outros motivos, que a contribuição deve ser proporcional à capacidade econômica do alimentante, não superando a possibilidade de ambos os genitores, principalmente quando houver o compartilhamento da guarda.

No processo 0700068-07.2018.8.07.0001, O juízo a quo, em sentença, entendeu que, por inexistirem outros gastos por parte do réu, e levando-se em consideração a idade do menor – 6 anos -, arbitrou o percentual em 25% dos vencimentos brutos do genitor, abatidos os descontos compulsórios.
Em apelação do requerido contra o percentil arbitrado, decidiu-se por reduzir o percentual dos alimentos, pois se entendeu, dentre outros motivos, que a contribuição deve ser proporcional à capacidade econômica do alimentante, não superando a possibilidade de ambos os genitores, principalmente quando houver o compartilhamento da guarda:

DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. NECESSIDADE. OPORTUNIDADE.
RAZOABILIDADE. GUARDA COMPARTILHADA. ALIMENTOS “IN NATURA”. REDUÇÃO.
[…]
Com efeito, o Código Civil, em seu art. 1.694, § 1º, dispõe que os alimentos devem ser fixados com observância ao binômio necessidade do alimentado e possibilidade do alimentante.
A necessidade do filho, em relação à contribuição de seu genitor para seu sustento, independe de maior dilação probatória, levando-se em conta, também, o exercício da guarda compartilhada e da existência de alguma divisão de despesas relativas aos cuidados cotidianos como transporte e alimentação, deveres que decorrem, inclusive, do próprio dever legal do pai.

Nesse sentido, Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald lecionam:

A necessidade (que é presumida em favor dos filhos menores, sob o poder familiar) decorre da ausência de condições dignas de sobrevivência sem o auxílio do alimentante. Deve ser provada por quem pleiteia os alimentos e não se restringe à alimentação e saúde, envolvendo, por igual, a educação e a moradia, além do lazer e das atividades intelectuais.

Nesta toada, quando da fixação dos alimentos, o magistrado deve utilizar como base a capacidade de quem presta e a necessidade de quem os recebe.

Com efeito, a necessidade da criança em relação à contribuição de seus genitores para seu sustento independe de maior dilação probatória, uma vez que decorre, inclusive, do próprio dever legal, sendo certo que ambos os pais devem arcar com as despesas de seus filhos na medida de suas possibilidades. Os gastos da criança apresentados não podem ultrapassar a realizada social dos seus genitores. A capacidade do genitor restou evidenciada e da genitora também. Assim, apesar do alegado pelo genitor, ora apelante, de também dividir algumas despesas com a genitora, o que caracteriza o fornecimento de alimentos in natura, embora não quantificável; é inegável que esta assume a maior parte dos gastos relativos aos cuidados da criança. De outra sorte, a contribuição, em que pese dever ser proporcional também à capacidade econômica do alimentante, não tem o condão de superar a possibilidade de ambos os genitores e da característica social deles, mormente quando a guarda for compartilhada. Dessa forma, entende-se por assistir parcial razão ao apelante, de modo a entender-se razoável arbitrar os alimentos em 20% de seus vencimentos, sem prejuízo do custeio do plano de saúde, uma vez que, repito, ambos os pais devem arcar com as despesas de seus filhos na medida de suas possibilidades (Acórdão n.1179731, Relatora: LEILA ARLANCH 7ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 19/06/2019, Publicado no DJE: 25/06/2019.).

A respeito da decisão que deu provimento parcial ao recurso, é preciso tecer dois comentários. Primus, como visto, houve um reconhecimento de equalização. E essa equalização se mostra implícita, se traduzindo em uma exoneração parcial, reconhecendo a proporcionalidade, de modo a não superar a capacidade econômica dos genitores. Secundus, a equalização pode ser vista como uma modalidade de compartilhamento uma vez que ambos os genitores devem arcar com as despesas de seus filhos com base nas possibilidades de ambas as partes.

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo teve por propósito analisar a possibilidade jurídica da exoneração de alimentos, na guarda compartilhada.

O breve estudo serviu para expor as definições de guarda, alimentos, a obrigação e o dever da prestação de alimentos no compartilhamento da guarda, onde constatou-se que os alimentos são os propulsores dos indivíduos, de forma que nenhuma pessoa pode sobreviver sem eles.

Verificou-se, ainda que a modalidade da guarda compartilhada compreende na sua totalidade os direitos dos menores, respeitando para isto o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, integrantes da doutrina da proteção integral, e portanto, aquela mais benéfica ao menor.

Entretanto, após a alteração legislativa concretizada por meio da Lei nº 13.058 de 2014, a qual determinou que a guarda compartilhada atribuiria aos genitores o gozo do mesmo período ao lado do menor, alguns pontos em relação ao assunto ficaram controversos, e dentre tais pontos está a possibilidade da exoneração dos alimentos no compartilhamento da guarda.

Percebeu-se, alicerçado em um entendimento judicativo maciço, que a guarda compartilhada, por si só, não autoriza a exoneração da obrigação alimentar antes fixada. Mas há ainda um paradoxo oneroso: o compartilhamento de responsabilidades versus a unilateralidade de alimentos.

O fato é que os alimentos precisam ser fixados de forma justa para ambos os genitores, abarcando ao máximo as necessidades do alimentado, sem onerar por demasia o alimentante. Vale observar que o cálculo dos alimentos deve estar pautado na necessidade da criança e do adolescente, e esse valor ser compartilhado entre os genitores dentro da lógica possibilidade e proporcionalidade. Há também de convir que o alimentante sem o lar de referência tem as suas despesas oneradas, quando o alimentado permanece sob a sua guarda física.

Verifica-se a existência de situações em que é desnecessária a instituição de alimentos em favor dos filhos durante a guarda compartilhada, como por exemplo, quando os genitores possuírem dois filhos e cada um deles reside com um dos genitores. A guarda neste caso é compartilhada quanto à responsabilidade parental atribuída aos pais, mas quanto à mantença, cada um dos genitores manterá o filho, que sob a sua custódia física estiver.
Assim, em verdade, na aplicação do instituto da guarda compartilhada existe a possibilidade da redução/partilha dos alimentos, considerando, pois, que cada família possui a sua forma própria de organização e diálogo.
Porém, não se entende, ainda, claramente, o compartilhamento de deveres dentro da guarda compartilhada, pois os alimentos ficam estabelecidos unilateralmente para somente uma das partes, prevalecendo uma tradição, muitas vezes chauvinista.

REFERÊNCIAS

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BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal Acórdão n.902557, Relatora: FÁTIMA RAFAEL 3ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 21/10/2015, Publicado no DJE: 29/10/2015. Pág.: 191 Disponível em: https://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj. Acesso em 29 set 2019.
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BRASIL. Tribunal de Justiça do Pará – Apelação 00058515020118140040 Belém, Relator: Ezilda Pastana Mutran. Data de Julgamento: 23/06/2016, 2ª CÂMARA CÍVEL ISOLADA, Data de Publicação: 23/06/2016). Disponível em: https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/informativos/2016/informativo-de-jurisprudencia-n-337/guarda-compartilhada-2013-impossibilidade-de-exoneracao-de-alimentos. Acesso em: 29 set 2019.
BRASIL. TRIBUNAL DE SANTA CATARINA. Apelação 20130294119. Disponível em: http://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23922362/apelacao-civel-ac-20130294119-sc-2013029411-9-acordao-tjsc. Acesso em: 05 set. 2019.
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TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental. Rio de Janeiro: Renovar, 2005

Danilo Porfírio de Castro Vieira
Possui graduação em Direito pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2000), mestrado em Direito pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2003), doutorado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2018) e Pós-doutorado em Letras Orientais pela Universidade de São Paulo. Atualmente é professor titular de Relações Internacionais e Direito no Centro Universitário de Brasília (Uniceub) e professor de Direito no Instituto de Direto Público do Distrito Federal (IDP). Tem experiência na área de Teoria Geral do Direito, Direito Civil, Direito Internacional e Filosofia do Direito. Associado da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS).

Paulo Roberto Costa dos Santos
Possui graduação em Direito pelo Instituto de Direito Público do Distrito Federal (IDP), Análise de Sistemas pela Universidade Estácio de Sá, Pós-Graduação em Gestão em Controladoria Governamental pela Faculdade OMNI, pós-graduando em Direito Imobiliário pela Escola Superior Universitária. Atualmente é Auditor do Governo do Distrito Federal.

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