Associação de Direito de Família e das Sucessões

“DIVÓRCIO SURPRESA” É TEMA DE ENTREVISTA DE REGINA BEATRIZ, PRESIDENTE DA ADFAS, EM REPORTAGEM DO JORNAL GAZETA DO POVO

Regina Beatriz Tavares da Silva, Fundadora e Presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), é entrevistada pelo jornal Gazeta do Povo para falar sobre o “divórcio surpresa”.

Leia a reportagem completa: “Divórcio surpresa”: Senado debate mudanças sobre a dissolução do casamento

Para aprofundar e facilitar o entendimento da matéria, leiam as seguintes perguntas e respostas:

TENTATIVAS DE FACILITAR A DISSOLUÇÃO DO CASAMENTO PELA VIA EXTRAJUDICIAL

– Quando a ADFAS identificou esta tendência de facilitar a dissolução do casamento pela via extrajudicial?

A Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), fundada por Dra. Regina Beatriz Tavares da Silva, desde o ano de 2013, vem identificando tentativas de banalizar a dissolução do casamento, por meio do chamado “divórcio impositivo”, que não se confunde com o ditame constitucional do divórcio sem prazos ou procedimentos prévios introduzido pela Emenda Constitucional 66/2010.

– A entidade tem uma estimativa de quantas são estas tentativas, tanto no CNJ como no Senado?

No ano de 2019, a Corregedoria de Justiça do Estado de Pernambuco editou provimento para possibilitar o chamado “divórcio impositivo”. Pretendia esse provimento que um dos cônjuges fosse ao Cartório de Registro Civil e mandasse notificar o outro cônjuge de que estariam divorciados. A seguir, no mesmo ano, a Corregedoria de Justiça do Estado do Maranhão editou provimento no mesmo sentido. Segundo esses provimentos a notificação de divórcio independeria da presença ou da anuência do outro cônjuge, cabendo-lhe somente ser comunicado de que o divórcio seria averbado pelo oficial do registro civil.

Um “divórcio surpresa”, era isto que se pretendia. O notificado estaria divorciado sem ter tempo de sequer pedir ao Poder Judiciário a proteção de seus direitos, como uma pensão alimentícia para o seu sustento, incluindo a manutenção de seu plano de saúde sendo o notificante o respectivo titular, ou a permanência no domicílio conjugal se o imóvel pertencesse ao notificante.

A ADFAS apresentou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) os fundamentos para que aqueles provimentos fossem revogados, que foram acolhidos pela Corregedoria Geral de Justiça no mesmo ano de 2019.

O casamento é um negócio jurídico bilateral, que estabelece “comunhão plena de vidas” conforme o Código Civil (art. 1.511). A celebração do casamento não pode ser levada a efeito sem a presença simultânea de ambos os nubentes, como estabelece o Código Civil (art. 1.535). E o casamento produz vários efeitos pessoais e patrimoniais, obrigando o cônjuge ao cumprimento de deveres, como estabelece o Código Civil, entre os quais a assistência material e imaterial e o respeito e consideração, no art. 1.566. Não se pode admitir que o cônjuge, que assumiu deveres pelo casamento, possa desfazer esse vínculo sem o consentimento do outro consorte ou, na falta do consentimento, sem uma decisão judicial que proteja os direitos do cônjuge mais vulnerável.

Além disso, um ativismo judicial intolerável ocorreu por meio daqueles dois provimentos que foram revogados no mesmo ano de 2019. Os atos administrativos dos desembargadores corregedores de justiça de Pernambuco e do Maranhão não poderiam alterar ou criar direitos e procedimentos privativos do Poder Legislativo, muito menos por meio de provimento notoriamente inconstitucional e violador da norma que estabelece o dever especial do Estado de proteger a família e, por conseguinte, os membros da família, ou seja, os cônjuges (Constituição Federal, art. 226, caput).

Corregedorias de justiça não têm competência para alterar a lei que regula o divórcio e a separação extrajudicial e estabelece que sua realização somente pode ocorrer por meio de acordo entre os cônjuges que podem assinar, juntos, uma escritura pública de dissolução do casamento, lavrada em Tabelionato de Notas, com a presença de advogado que oriente o casal, sendo que, em havendo filhos incapazes (menores de 18 anos ou maiores com deficiência mental), com a intervenção do representante do Ministério Público, na conformidade do Código de Processo Civil (art. 733).

Incansáveis nesse movimento de banalizar o casamento, logo após a revogação daqueles provimentos das mencionadas corregedorias de Pernambuco e do Maranhão, foi apresentado no Senado Federal por Rodrigo Pacheco um projeto de lei que propõe que um dos cônjuges possa requerer a averbação de divórcio, por meio de mera notificação ao outro consorte, diretamente no cartório de registro civil (PL 3457/2019), o qual aguarda a designação de relator.

Os danos que esse projeto de lei pode vir a acarretar são terríveis.

A título de exemplo dos prejuízos que esse PL pode acarretar, um cônjuge que seja beneficiário do outro em plano ou seguro de saúde, pode ter revogados esses benefícios num “passe de mágica”, porque com a averbação do divórcio na certidão de casamento, a empresa empregadora do titular eliminará o dependente, inclusive porque os planos e seguros de saúde não aceitam beneficiários ou dependentes divorciados.

– Qual é a agenda que está oculta nessas tentativas?

Esse movimento de facilitar a dissolução extrajudicial do casamento por mera notificação extrajudicial de um dos cônjuges ao outro por meio de Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais (RCPN) pretende, em verdade, fragilizar o casamento.

Sem a devida reflexão diante de uma discussão do casal, que poderia ser superada no decorrer do tempo, um dos cônjuges poderia desfazer o casamento por mera notificação extrajudicial.

Isto tem em vista destruir a família, por meio da fácil e rápida dissolução do casamento.

É o que existe por detrás daquele movimento. Facilitando-se a extinção da célula básica da sociedade, que é a família, fragiliza-se a nação, o cidadão se enfraquece e forças ditatoriais podem vencer e impor o que bem entenderem sem maiores resistências. Isto já ocorreu em outros países, a história nos conta as péssimas consequências da banalização do casamento, esperamos que em nosso Brasil essa triste trajetória estrangeira não seja repetida.

Essas tentativas de “divórcio impositivo’ ou “divórcio surpresa” que tentam obnubilar as mentes dos cidadãos brasileiros com argumentos falaciosos de autonomia da vontade, de dificuldades de obtenção do divórcio quando o outro cônjuge não concorda com a dissolução do vínculo conjugal, em verdade, têm por detrás o objetivo de banalizar o casamento, por meio de sua rápida e irrefletida dissolução, enfraquecendo a célula básica da sociedade para alcançar outras finalidades ali escondidas e ainda mais perversas.

A ADFAS já venceu no CNJ essas tentativas de banalização do casamento por meio do divórcio impositivo e trabalhará pela não aprovação do PL do divórcio impositivo que tramita no Senado.

Está aberta pesquisa de opinião sobre essa matéria no site do Senado Federal. Clique aqui para votar.

– Como está sendo tratado o “divórcio surpresa” no Poder Judiciário?

Esse movimento da exagerada rapidez do divórcio chegou ao Poder Judiciário com algumas decisões contrárias aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, decretando o divórcio no início da ação judicial, sem que o cônjuge demandado seja citado. Uma pessoa deixa de ter o estado civil de casada sem saber que está divorciada! Ainda são poucas essas decisões, mas espera-se que não sirvam de paradigmas para outras sentenças, porque um juiz de direito deve proteger e tutelar direitos e não desproteger os jurisdicionados decretando o “divórcio surpresa”. Note-se que a lei brasileira no Código de Processo Civil já autoriza o divórcio no início do processo judicial, mas, sempre, posteriormente à citação do outro cônjuge, para que possa apresentar seus pedidos, como o de pensão alimentícia e de permanência no domicílio conjugal, necessidades que têm os consortes mais vulneráveis na relação de casamento.

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