O QUE SE LEVA EM CONSIDERAÇÃO AO DEFINIR QUAL É O VALOR DA PENSÃO ALIMENTÍCIA?

Por Adriana Douglas*
Durante um processo de separação ou divórcio, muitos casais acabam se deparando com a questão da pensão alimentícia para os filhos. O benefício, que é um direito definido por lei para crianças ou adolescentes de até 18 anos, costuma gerar diversas dúvidas que nem sempre são esclarecidas no decorrer do processo.
Antes de qualquer coisa, os pais devem saber que a pensão pode ser solicitada por aquele que detém a guarda total ou majoritária do filho. Isso quer dizer que tanto a mulher quanto o homem têm a possibilidade de exigir o benefício que é exclusivamente direcionado para o sustento das crianças.

Para que serve o valor da pensão alimentícia?

Sob os olhos da lei, o pagamento da pensão alimentícia é determinado para o suprimento de todas as necessidades básicas de sobrevivência de uma criança ou jovem. Ou seja, embora o nome esteja relacionado à palavra “alimento”, esse instituto não se limita apenas aos recursos necessários à alimentação propriamente dita.

Portanto, a quantia estabelecida pelo juiz é também destinada a outras despesas essenciais do filho, incluindo os custos com moradia, vestuário, educação, lazer e saúde. Porém, o valor determinado na Justiça nunca pode prejudicar, de forma significativa, as condições de subsistência de quem paga a pensão.

Como funciona o cálculo da pensão

Estabelecido sempre por um juiz, o valor da pensão alimentícia é fixado em função de um binômio, que analisa as possibilidades do pagador e as necessidades de quem recebe. No entanto, muitos juristas ainda incluem um terceiro fator nessa contagem, que considera a proporcionalidade das situações financeiras de cada parte.
De acordo com Regina Beatriz Tavares da Silva, advogada especializada em Direito de Família e presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS), o cálculo considera primeiro as necessidades reais do filho. Depois, chega-se a um valor que deve se enquadrar nas possibilidades do pai ou da mãe, dentro do rateio proporcional entre as partes.

“Se o pai tem maiores possibilidades, ele é quem vai arcar com a maior parte das despesas do filho. Se a mãe tem menos possibilidades, ela vai pegar menos despesas do filho. Agora, se a mãe tem mais possibilidades, ela é quem vai pagar mais despesas do filho. E assim por diante”, explica a especialista.
Embora a lei brasileira não estabeleça parâmetros ou percentuais fixos para o valor da pensão, Regina afirma que existe um parâmetro jurisprudencial nos tribunais do País que estabelece que a pensão alimentícia não ultrapasse 33% dos rendimentos de quem paga a pensão. Porém, cada caso é avaliado e julgado individualmente e há exceções à regra.

Tabela de despesas para calcular pensão

Para se determinar adequadamente os custos das necessidades do filho, muitos advogados fazem uso de uma tabela com todas as despesas descritas. O dispositivo pode ser apresentado por qualquer uma das partes do processo e não é obrigatório nos autos. Sem contar que ele pode ser contestado ou revisado a qualquer momento.
“É importante tabelar as despesas. Por isso, tanto a mãe quanto o pai podem elaborar uma planilha que indica cada gasto detalhado com o sustento do filho. Isso tem que estar apresentado no processo para que o juiz possa avaliar os números, junto com os comprovantes, e determinar a quantia ideal da pensão”, esclarece Regina.

Quando o valor da pensão pode ser alterado?

Por lei, o pagamento da pensão alimentícia é obrigatório até que os filhos completem a maioridade (18 anos de idade) ou, até que terminem algum tipo de estudo (seja no ensino técnico ou superior), ou ainda se casarem ou passarem a viver em união estável.
É importante ressaltar que a questão do pagamento de pensão alimentícia não é apenas jurídica, mas também afetiva. Isso quer dizer que o pai ou a mãe pode continuar fornecendo o benefício ao filho até quando quiser – independentemente dos limites determinados pela lei.
Segundo a advogada Ivone Zeger, especialista em Direito de Família, ao longo do período em que a pensão estiver vigente, porém, ela pode vir a ser alterada para mais ou para menos, sempre que ficar comprovada a necessidade de modificação do valor – seja por conta das condições financeiras de quem paga ou pela mudança das necessidades de quem recebe.
Por exemplo, nos casos em que o pagador da pensão muda de emprego, passando a receber mais, ou fica desempregado, perdendo sua fonte de renda, ele pode solicitar a revisão ou até a exoneração do valor estabelecido na Justiça. O mesmo vale para o filho, que também pode passar por mudanças em suas necessidades no decorrer dos anos, precisando de mais ou menos ajuda financeira.

Para aumentar ou reduzir o valor da pensão, a parte interessada na mudança deve ingressar uma nova ação judicial no processo, chamada de ação revisional de alimentos. Esta será julgada pelo juiz da Vara de Família, podendo ou não ocasionar a alteração da quantia da pensão.

O que acontece com quem não paga a pensão?

Quando o pai ou a mãe não tem condições financeiras de arcar com o pagamento da pensão alimentícia, outros integrantes da família poderão assumir a dívida judicialmente, seja para o valor integral ou parcial. Nestes casos, os avós, os tios e até os irmãos do pensionista são acionados pela Justiça.
Agora, em situações nas quais o alimentante não paga o valor, o beneficiário da pensão pode procurar a Justiça para que seja emitida uma ação de execução de alimentos. Esta ação pode ser movida logo que uma prestação do pagamento não é feita e torna o pagante negativado perante os órgãos de proteção ao crédito, entre outras consequências.
Além disso, caso o devedor ultrapasse três meses sem quitar a dívida de pensão com o beneficiário, o mesmo pode ser preso em regime fechado. No julgamento, o juiz pode decretar prisão de 30 a 90 dias (1 a 3 meses), período que pode ser estendido para mais 90 dias se o detido não firmar um novo acordo com a parte reclamante.

Como entrar com pedido de pensão alimentícia?

O código de processo civil brasileiro possui procedimentos eficazes para acelerar o julgamento das ações que solicitam a pensão alimentícia. Porém, a decisão final depende muito da complexidade de cada caso e também do próprio local em que corre o processo – em geral, as Varas de Família localizadas em cada cidade ou região.
Quem quiser dar entrada ao pedido de pensão deve contratar um advogado ou procurar um defensor público e providenciar todos os documentos necessários solicitados pela Justiça, que incluem certidões e comprovantes sobre as capacidades financeiras de cada parte.
Ao receber o pedido inicial, o juiz estabelece de imediato a concessão de alguns “alimentos” provisórios, que vão vigorar até o término da ação. Isso é feito para que o solicitante da pensão não fique sem nenhum recurso fundamental durante o processo.

Direito da criança

Acontece que a teoria parece simples, mas há muitos desafios a serem superados, o que toda família que enfrentou ou enfrenta processos desse tipo já sabe. Peter Gabriel Molinari, defensor público que atua no Núcleo Especializado da Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, explica é que o modelo processório não é compatível com a realidade socioeconômica e cultural das famílias brasileiras atuais.
O modelo coloca as partes em conflito e não envolve a criança no processo, o que, de certa forma, impede o protagonismo dela na própria ação que avalia suas reais necessidades.
“A grande maioria dessas ações que envolvem pedidos de pensão alimentícia são feitos pela mãe e pelo pai. Quando a criança é muito pequena, dificilmente consegue participar do processo, ela não consegue protagonizar o próprio papel dela, e é pensando nesse paradigma, que devemos lutar. Quando se discute uma pensão de criança em idade mais avançada, a criança já pode sentar e opinar”, diz Molinari.
O que acontece, no entanto, e por vezes é motivo de grandes confrontos entre as partes, é que são avaliadas somente as necessidades e possibilidades dos pais e o que estes julgam e conseguem provar serem as necessidades da criança. A crítica expõe a carência de auxílios e suportes que não são fáceis de medir.
“O modelo de processo é visto mais como um modelo de prestação econômica. Não envolve o apoio afetivo e de auxílio ao desenvolvimento da criança”, explica o defensor.
Essas dificuldades tendem a gerar uma verdadeira bola de neve já conhecida. Em um cenário de crise econômica, o pai e a mãe se colocam um contra o outro, e uma das partes não consegue arcar com as despesas. A outra executa a dívida e os dois não conseguem, juntos, trabalhar pela construção de algo maior em benefício do filho.
“Esses processos são sempre julgados com base no que as outras pessoas entendem que é o melhor interesse da criança: é o que o juiz decide, o advogado defende que é o melhor. Sem, de fato, olhar o que é melhor para a criança. O desafio é envolver o restante da família, a comunidade, sair um pouco do modelo e tentar entender o contexto em que esses pais estão envolvidos”, finaliza.
*Jornalista de São Paulo.
Fonte: Vix (16/07/2018)
Imagem: Shutterstock

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