ENTREVISTA DA PRESIDENTE DA ADFAS À GAZETA DO POVO SOBRE O PL DE REVOGAÇÃO DA LEI DA ALIENAÇÃO PARENTAL E O GT DA ASSOCIAÇÃO.

Projeto de lei que pede a revogação da Lei de Alienação Parental está pronto para pauta na Comissão de Cidadania e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.

A Lei de Alienação Parental (LAP) foi criada para coibir que familiares — sejam pai, mãe, avós ou outros responsáveis — dificultem ou impeçam a convivência da criança com um de seus genitores. As situações mais comuns ocorrem quando os conflitos do relacionamento conjugal interferem negativamente na relação dos filhos com os pais. É o caso, por exemplo, de um genitor que mente ou fala mal do ex-parceiro para afastar a criança de sua convivência. Ou quando, após o falecimento de um dos pais, os avós da parte falecida tentam enfraquecer ou impedir a relação da criança com o genitor que permanece vivo.

Regina Beatriz Tavares da Silva, presidente da Associação de Direito de Família e Sucessões (ADFAS), tem se preocupado com a possível revogação da norma. “Há inúmeras situações em que os filhos são usados como instrumento de vingança contra o outro genitor. Por quê? Porque houve uma separação não desejada ou porque houve a consolidação de uma nova relação do ex-cônjuge ou do ex-companheiro. E, conforme o afastamento entre o filho e o genitor alienado se prolonga, o próprio filho sofre uma ‘lavagem cerebral’ provocada por quem não desejava a separação”, alerta.

Mães relataram problemas com a Lei de Alienação Parental a parlamentares de direita

Para a bancada feminista e parte da direita, a LAP não produz os efeitos esperados da lei e, por isso, deve ser revogada, para que crianças não tenham contato com pais e mães abusadores. O projeto que tramita na Câmara foi apresentado pelas deputadas psolistas Fernanda Melchionna (PSOL-RS), Vivi Reis (PSOL-PA) e Sâmia Bomfim (PSOL-SP) em 2022, mas a discussão favorável à revogação conta com o apoio de parlamentares de direita desde 2017.

Naquele ano, durante a CPI dos Maus-Tratos, presidida pelo senador Magno Malta (PL-ES), a proposta de extinguir a lei ganhou forças após mães relatarem que a norma teria colocado seus filhos em situações de risco. Segundo os depoimentos, a lei estaria sendo mal aplicada pela Justiça, pois ao denunciar os pais por abusos, elas teriam sido acusadas de praticar alienação parental. Ou seja, dessa forma, a lei estaria sendo usada para manter a criança no convívio de pais abusadores.

Em 2023, a Senadora Damares Alves (Republicanos-DF) passou a apoiar oficialmente a pauta das psolistas, ao apresentar um parecer favorável à revogação na Comissão de Direitos Humanos do Senado, onde também tramita um projeto de lei que pede a revogação da norma.

“Pode-se afirmar que a revogação da Lei de Alienação Parental é um tema que se encontra amadurecido para a sua aprovação em curto prazo, pois é defendida por diferentes correntes políticas que integram o parlamento e é também uma manifesta vontade da sociedade”, destacou a senadora durante a leitura do seu parecer, em 2023. Procurada pela reportagem, Damares não se manifestou até o fechamento do texto.

Já o senador Magno Malta, autor do projeto de lei que tramita no Senado Federal, defendeu durante a discussão que as mães que denunciam abusos devem ser respeitadas. “Nós temos hoje, aqui no Brasil e nas nossas fronteiras, exatamente nesse momento, 46 mães com os filhos escondidos, por ordem de juízes, para serem devolvidos aos abusadores”, destacou o parlamentar na ocasião.

Consequências da alienação parental podem ser irreversíveis na formação de crianças

Regina Beatriz explica que quando há denúncia de abuso por parte de um dos genitores, o caso passa a tramitar na maior parte de vezes de forma simultânea na esfera criminal e na Vara de Família, para que se apure a veracidade dos fatos. Segundo a Lei de Alienação Parental, o contato da criança com o genitor denunciado, a depender das circunstâncias, deve ser garantido, ainda que por meio de visitas assistidas, desde que não haja um risco iminente de prejuízo à criança.

Apenas se for comprovada que a denúncia foi falsa e feita com o objetivo de afastar indevidamente o outro genitor, é que há a aplicação de uma sanção. As punições previstas na lei são graduais, conforme a gravidade do caso, e incluem advertência, multas e, em situações mais extremas, a perda da guarda.

A jurista explica que todo esse processo precisa ser conduzido de forma cautelosa, justamente porque as consequências do afastamento injustificado de um dos genitores, muitas vezes, podem ser permanentes. “Talvez, mesmo na fase adulta, o filho alienado já esteja emocionalmente destruído. Porque uma criança precisa tanto da mãe quanto do pai para a sua formação, desde que ambos tenham aptidão e cumpram os seus deveres perante os filhos”, ressalta.

Para especialistas em Direito de Família, problemas da LAP seriam resolvidos com ajustes na lei

Tanto a ADFAS quanto o Instituto Brasileiro de Direito de Família e Sucessões (IBDFAM) realizaram estudos específicos sobre a LAP. Embora o IBDFAM adote posições mais progressistas — como a defesa de direitos para amantes —, a entidade também se posiciona firmemente pela manutenção da lei.

Em artigo publicado no site da ADFAS, Kátia Boulos, Verônica Cezar-Ferreira, Denise Perissini e Eduardo de Oliveira Leite, integrantes de grupo de trabalho da associação, explicam com mais detalhes as motivações para a manutenção da Lei da Alienação Parental.

Em uma entrevista publicada no site do instituto, Renata Nepomuceno e Cysne, coordenadora do Grupo de Estudo e Trabalho sobre Alienação Parental do IBDFAM, também aponta para o risco jurídico e social de uma revogação. “[Se houvesse uma revogação], teríamos uma lacuna considerável com relação à efetivação da convivência familiar, um retrocesso com relação à proteção de crianças e adolescentes”, disse.

Cysne também ressaltou que a retirada da lei do ordenamento jurídico também compromete outras normas e, por isso, é importante que essas “consequências sejam melhor compreendidas e debatidas por diversos agentes do sistema de proteção”.

Os casos controversos seriam exceções que poderiam ser resolvidas com instituição de protocolos, de acordo com Regina Beatriz. “Não há dúvida de que a Lei de Alienação Parental exige aperfeiçoamentos”, defende.

Fonte: Gazeta do Povo

 

 

 

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