EX-CÔNJUGES, MAS ATUAIS COMPANHEIROS

A Emenda Constitucional nº 66 de 2010, a Emenda do Divórcio, eliminou a exigência da prévia separação, judicial ou de fato do casal para o fim definitivo do casamento através do divórcio. Na redação original da Constituição, o casamento poderia ser dissolvido pelo divórcio somente após um ano de separação judicial ou dois anos de comprovada separação de fato do casal, era o chamado sistema bifásico de dissolução do casamento. Desde a entrada em vigor da Emenda nº 66, o casamento passou a ser dissolúvel pelo divórcio a qualquer tempo, com ou sem separação prévia, a pedido de um ou de ambos os cônjuges, por via judicial ou extrajudicial.
O processo de divórcio nunca foi tão fácil e rápido como hoje, e não falta quem veja nisso um grande avanço do direito de família no Brasil. Mas, a bem da verdade, é um fato que divórcio rápido e fácil significa muitas vezes divórcio precipitado.
Há vários exemplos de casais que, num momento de profunda crise no casamento, não conseguiram encontrar outro remédio para os problemas conjugais e se divorciaram, mas, tempos depois, superada a raiva, o ressentimento e a frustração trazida pelos antigos problemas, perceberam que ainda amavam um ao outro e reataram a relação.
Quando isso ocorre, é raro o casal “recasar”; o mais comum acaba sendo reatarem o relacionamento apenas no plano nos fatos, isto é, voltarem a viver juntos, pública, continua e duradouramente, com o propósito de reconstituir a família. Ou seja, retomam a família, mas agora sob uma nova forma: a forma de união estável.
A decisão de viverem juntos novamente pode parecer inócua, mas na verdade, gera os mesmos efeitos do casamento. Quando digo os mesmos, hoje em dia são exatamente os mesmos. Os ex-cônjuges passam a ser companheiros e o regime de bens, salvo um pacto em contrário, será da comunhão parcial de bens. Se a união estável for dissolvida haverá a renovação do direito à pensão alimentícia de quem necessitar. Direitos sucessórios um terá em relação ao outro, como se casado fosse. Enfim, todos os efeitos como se fossem casados.
Também haverá direito previdenciário, como recentemente decidiu o Tribunal Regional Federal da 3ª Região: o INSS deve conceder pensão à viúva de um segurado com quem, apesar de divorciada, vivia em união estável. O casal havia se divorciado em 1992, mas doze anos depois reataram o convívio familiar, vivendo juntos em união estável até a morte do companheiro. O INSS pagava a pensão por morte do filho mais novo do casal, mas em 2009, com a maioridade do rapaz, encerrou completamente o benefício. A viúva requereu, então, o benefício em seu nome, mas o teve negado pelo INSS, que alegava não ter a mulher direito ao benefício, pois, ainda que vivesse juntamente com o falecido, dele estava divorciada há muitos anos. O TRF rejeitou este argumento, explicando corretamente que, desde que a mulher conseguisse comprovar a união estável com o falecido ao tempo do óbito – o que ela havia conseguido já na primeira instância -, pouco importava que ela houvesse se divorciado do mesmo homem duas décadas antes. Eles eram companheiros ao tempo do falecimento, e como companheiros deveriam ser tratados, beneficiando-se dos direitos inerentes a esta relação familiar, entre os quais, justamente, os direitos previdenciários.
Assim, quando ex-cônjuges voltam a se relacionar afetivamente um com o outro, embora pensem que nenhum efeito surgirá dessa relação no plano dos fatos e sem casamento civil, é preciso que saibam que todos, absolutamente todos os efeitos jurídicos, como se casados fossem, voltarão a ser produzidos na relação.
Nem mais casados, nem mais divorciados: companheiros.

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