A TRANSMISSÃO DAS SESSÕES DO STF PELA TV JUSTIÇA DEVE ACABAR?
Por Carlos Alberto Dabus Maluf*
É sabido que desde a criação da TV Justiça as transmissões ao vivo têm dividido a opinião dos operadores do Direito, notadamente dos ministros e dos advogados. Já a sociedade, grande interessada no desfecho das decisões ali exaradas, tem-se mostrado amplamente favorável à transmissão ao vivo dos julgados da Corte Máxima do país.
É evidente que existem prós e contras. O custo seria um dos elementos a se considerar. A teatralidade das condutas dos envolvidos, querendo mídia e palco, também. Entretanto, o que pesam esses fatos diante do direito personalíssimo da informação da sociedade, notadamente na era atual? Inicialmente, é válido ressaltar que a TV Justiça é um canal público e não lucrativo, administrado pelo STF, criada por intermédio da Lei nº 10.461/2002, e que tem por objetivo aumentar a publicidade dos atos do Poder Judiciário e dos serviços essenciais à Justiça, aproximando a sociedade e o Direito.
Se por um lado, constitui uma prática inovadora e pioneira, posto não se tem notícia de sua larga utilização em outros países da comunidade internacional; por outro, intensifica debates ásperos, intensos e midiáticos, sobretudo nos casos que possuem grande visibilidade. Nesse sentido, entendo que não: a transmissão das sessões do STF pela TV Justiça não deve acabar. Observa-se na realidade nacional uma migração da resolução de questões relevantes de cunho moral, social e político para as mãos do Poder Judiciário, o que levou a uma maior imperatividade de transparência, publicidade e acesso aos julgados pela sociedade em geral.
Entretanto, no Legislativo tramita um Projeto de Lei (PL nº 7.004/13), de autoria do deputado federal Vicente Candido, do PT-SP, que visa proibir a transmissão ao vivo da emissora pública. O parecer contra o PL foi aprovado por unanimidade, uma vez que a sua aprovação poderia levar ao estabelecimento de uma espécie de censura prévia autorizada pela Justiça, representando, por si, uma perda significativa para o interesse público e um retrocesso do processo de consolidação da democracia no país.
A Constituição estabelece, em seu art. 93, IX, que: “Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade…”. Nesse sentido, o pleno acesso aos julgamentos confere maior aproximação da sociedade com o mundo jurídico; garante o direito à informação, desde que com o uso de linguagem simplificada, propiciando a afirmação da cidadania.
Não se descartando cautelas necessárias para que se cumpra o devido processo
legal, deve a sociedade ter acesso às decisões emanadas da Suprema Corte.
Há, com a transmissão dos julgados em tempo real, o afastamento dos intermediários entre os juízes e os destinatários das decisões – desenvolvendo o direito ao pensamento individual, consagrando o direito à informação, e à autonomia pessoal na tomada de decisões.
A publicidade dos julgados, mesmo em face dos pontos negativos que congrega, levou a um incremento da legitimação das decisões do STF, tendo em vista o fomento do diálogo entre a operacionalidade da lei e a sociedade. Há, por outro lado, alguns impactos negativos decorrentes das transmissões televisivas dos julgados: o de transformar juízes em celebridades, criando um falso mito, ou mesmo podendo levar a uma perda de imparcialidade.
O encurtamento da distância entre as instituições jurídicas e a vontade do povo, de tomar parte delas, representa elemento essencial à solidificação do Estado de Direito, posto que aumenta a confiança na administração da Justiça e na forma democrática de operar o Direito. Não se descartando cautelas necessárias para que se cumpra o devido processo legal, deve a sociedade ter acesso às decisões emanadas da Corte.
As vantagens da transmissão das sessões do STF pela TV Justiça são maiores que as suas desvantagens, pois possibilita conhecimento e informação, e abre espaço para reflexões, debates e manifestações populares, suplantando os efeitos complexos da mídia ou a dificuldade de compreensão que emana dos votos extremamente longos permeados de complexidade e regados ao uso corrente de vocabulário altamente complexo ou o sensacionalismo, visando a consolidação do processo democrático no país.
*Advogado, professor titular de Direito Civil da USP
Publicação original: Jornal do Advogado Edição nº 437 – abril 2018, páginas 12 e 13.