TJDFT: EXCLUSÃO SUCESSÓRIA POR INDIGNIDADE DO MEEIRO – FEMINICÍDIO
Recurso: Apelação Cível
Número do Processo:0706544-90.2020.8.07.0001
Relator: Desembargador Angelo Passareli
Órgão Julgador: 5ª Turma Cível
Data do Julgamento: 27/01/2021
Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. RECOLHIMENTO DO PREPARO PELO RÉU. PRECLUSÃO LÓGICA. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DA JUSTIÇA CONCEDIDA AOS AUTORES. BENEFÍCIO PERSONALÍSSIMO. LITISCONSÓRCIO ATIVO. ANÁLISE INDIVIDUALIZADA. HIPOSSUFICIÊNCIA DEMONSTRADA SOMENTE POR UM DOS AUTORES. REVOGAÇÃO PARCIAL DA BENESSE. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO CÍVEL. INOCORRÊNCIA. QUESTÃO DE ALTA INDAGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE DECISÃO INCIDENTAL EM AÇÃO DE INVENTÁRIO. PRELIMINAR REJEITADA. SUSPENSÃO DO PROCESSO. DESNECESSIDADE. INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS CÍVEL E CRIMINAL. PRELIMINAR REJEITADA. DECLARAÇÃO DE INDIGNIDADE. HOMICÍDIO DOLOSO DA EX-ESPOSA. COMPROVAÇÃO. EXCLUSÃO DA SUCESSÃO. EFEITOS. IMPEDIMENTO DO USO E DA ADMINISTRAÇÃO DOS BENS. ALIJAMENTO DO EXERCÍCIO DO DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. PRETENSÃO VEICULADA PELOS AUTORES. ACOLHIMENTO INTEGRAL. SUCUMBÊNCIA EXCLUSIVA DO RÉU. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
- O recolhimento do preparo configura preclusão lógica em relação ao pedido de concessão da gratuidade da Justiça, uma vez que se mostra incompatível com a condição de hipossuficiência que deve ser comprovada pela parte a fim de obter o benefício.
- – A exigência comprobatória da situação de miserabilidade econômica decorre expressamente do texto constitucional (art. 5º, LXXIV) ao dispor que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovem insuficiência de recursos”.
- – A gratuidade da Justiça consubstancia benefício de ordem personalíssima, de modo a demandar, em casos de litisconsórcio, um exame individualizado das distintas situações econômico-financeiras dos
- – A mera declaração de hipossuficiência não é suficiente para a concessão do benefício da gratuidade de Justiça, nos termos do artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal, notadamente quando os elementos constantes dos autos demonstram que o padrão de vida de um dos peticionários não se amolda à condição de efetiva Desse modo, impõe-se o acolhimento parcial da impugnação deduzida pela parte Ré, para revogar o benefício concedido ao 1º Autor (servidor público federal bem remunerado e morador de área nobre do Distrito Federal), mantendo-se, todavia, a benesse deferida à 2ª Autora (desempregada e considerada isenta para fins de declaração de imposto de renda), quem, por sua vez, logrou efetivamente comprovar a situação de hipossuficiência.
- – A jurisprudência desta Casa de Justiça é firme em interpretar o 612 do Código de Processo Civil/2015 no sentido de que ao Juízo Sucessório somente toca decidir questões incidentais de baixo grau de complexidade. É dizer, as controvérsias de alta indagação tanto jurídica como fática, justamente por demandarem densa produção probatória para serem solucionadas, não têm lugar no Juízo onde corre o Inventário e a Partilha dos bens do de cujus.
- – O pleito de exclusão de sucessor por indignidade, exceção feita à hipótese de já haver título condenatório definitivo na seara criminal, revela-se deveras complexo, notadamente porque pressupõe o revolvimento de extenso conjunto probatório, motivo pelo qual compete ao Juízo Cível processá-lo e julgá-lo.
- – Devido à independência havida entre as instâncias cível e criminal, a suspensão da marcha processual não constitui uma obrigatoriedade, mas, sim, uma decisão afeta a um juízo discricionário a cargo do Julgador na esfera civil. Caberá a este indeferir a suspensão quando tal medida não se revelar recomendável, máxime quando o Feito cível já estiver em estágio avançado do deslinde processual (fase recursal) e estiver munido com provas suficientes para possibilitar a formação da convicção a respeito do ilícito imputável ao Réu.
- – O mero fato de o Réu não concorrer, imediatamente, com os demais descendentes da falecida (CC, 1.829, I) – devido ao regime da comunhão universal de bens outrora havido com sua ex-consorte – não lhe retira o status de herdeiro necessário (CC, art. 1.845), motivo pelo qual pode, sim, ser declarado indigno, inclusive com o alijamento do direito real de habitação referente ao único bem imóvel a inventariar, notadamente porque o ordenamento jurídico veda a concessão de quaisquer benefícios ao indigno, que, aliás, fica privado do uso e da administração de todos os bens do de cujus (Código Civil, arts. 1.693, IV, e 1.816, parágrafo único).
- – Porquanto demonstrado nos autos que o Réu, feminicida confesso e preso em flagrante, matara cruel e dolosamente, com tiros à queima-roupa, sua ex-esposa, é de rigor declará-lo indigno, nos termos do 1.814, I, do Código Civil.
- – Em se constatando, a partir do conjunto da postulação e sob o prisma da boa-fé (CPC/2015, 322, § 2º), que a pretensão deduzida pela parte Autora foi completamente acolhida em Juízo, não há que se falar em sucumbência recíproca, mas, sim, em decaimento exclusivo do Réu, quem haverá de suportar integralmente as despesas processuais e os honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do art. 85 do Diploma Adjetivo Civil.
Preliminares rejeitadas.
Apelação Cível do Réu parcialmente provida. Apelação Cível dos Autores provida.
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Agência ADFAS de notícias (com informações do TJDFT)
Contribuição: Atalá Correia, Presidente da Seção Estadual do Distrito Federal da ADFAS, Doutor e Mestre em Direito CiviI pela Universidade de São Paulo, Professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e Juiz de Direito no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.