ARTIGO – LEI DA ALIENAÇÃO PARENTAL COMPLETA 14 ANOS

LEI DE ALIENAÇÃO PARENTAL COMPLETA 14 ANOS 

 

Dra. Kátia Boulos

Dra. Verônica Cezar-Ferreira 

Dra. Denise Maria Perissini da Silva 

Dr. Eduardo de Oliveira Leite 

 

Neste dia 26 de agosto a LAP – Lei de Alienação Parental (Lei nº 12.318/2010) – completa 14 (catorze) anos de vigência, em prova veemente de sua importância no cenário jurídico brasileiro, especialmente na proteção dos direitos das crianças e dos adolescentes vítimas de atos praticados por seus pais, parentes ou pessoas que sobre eles detenham guarda, autoridade ou vigilância, que os levam a romperem vínculos de afeto, interferindo em sua formação psicológica e resultando em graves consequências cognitivo-comportamentais que se projetam por toda a vida.   

A Lei, em pleno vigor há mais de uma década, revelou-se fundamental na proteção das pessoas mais vulneráveis, a saber, crianças e adolescentes, reforçando as premissas que já vinham sendo invocadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, garantindo o primado da proteção integral que deixa de privilegiar o interesse e a vontade dos adultos pela proposta de reconhecimento à criança e ao adolescente de direitos e proteção especiais.  

A inserção da proteção integral à criança “determina que é dever geral de cada brasileiro, adulto, capaz e responsável, protegê-la independentemente do parentesco ou das motivações e laços afetivos que o fazem agir em favor e no interesse do menor.” (Adriana de Fátima Nogueira. Indícios de abuso sexual infantil). E de igual forma, a norma constitucional destaca que o Estado por meio de seus poderes, deve dar à criança, vítima de qualquer tipo de violência, seja ela sexual ou psicológica, voz ativa para contar seu sofrimento em igualdade de condições, tendo assim a devida oportunidade para se expressar e ser protegida. 

A militância de determinados grupos autodenominados “defensores dos direitos humanos” lastreados basicamente em forte oposição midiática já tentaram, em diversas oportunidades, revogar a Lei nº 12.318/2010, sem que tenham obtido o menor sucesso em sua ingente tentativa.  

Com efeito, argumentos como: a referida Lei se basear em tese do psiquiatra norte-americano, Richard Gardner, destituída de comprovação científica; de ser utilizada por pais e padrastos acusados de abuso sexual para obter a guarda dos filhos sob acusação de que as mães acusadoras são, em verdade, alienadoras, sob a ótica de se tratar de uma lei misógina, entre outros equívocos, têm sido largamente divulgados em nível nacional, ultrapassando, recentemente, as fronteiras nacionais para se alojar em uma “audiência pública” perante o Comitê Interamericano de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA) sem a legítima oitiva de doutrinadores ou operadores da justiça familiarista.  

Tais tentativas de nulificar a Lei de Alienação Parental redundaram em insucesso, porque ditadas por meras ideologias tendenciosas que não conseguiram invalidar a importância de uma lei que veio para ficar e, certamente vem atendendo os interesses maiores da família brasileira que exigia uma resposta normativa firme e objetiva aos abusos que vinham ocorrendo em larga escala e que deixavam os tribunais brasileiros perplexos diante das distorções ocorridas nas relações paterno-materno-filiais.  

Mais recentemente, novas tentativas de aprovar outros projetos de leis (v.g., PL 1372/23, oriundo do Senado Federal, de autoria do Senador Magno Malta) são encaminhadas ao Congresso Nacional, com a mesma finalidade, embasado em crime de pedofilia, violência contra a mulher e outros “fundamentos” equivocados distanciando-se do real objetivo do legislador que continua sendo a proteção integral de crianças e adolescentes vítimas de manipulações de genitores (ou parentes) inescrupulosos que se servem de sua autoridade para impor medidas e procedimentos geradores de angústia, insegurança e temor, contrários ao sadio desenvolvimento de um ser humano. 

A mera análise das propostas invocadas para a revogação da LAP revela, porém, a fragilidade dos argumentos reiteradamente repetidos e sem conteúdo científico. A Lei de Alienação Parental continua incólume atendendo seu escopo maior – como tem afirmado a jurisprudência unânime dos Tribunais brasileiros – sem vacilações, apesar das diferenças regionais e tendências culturais que permeiam este país de dimensões continentais.  

E se esta constatação é incontestável, tal permanência e duração deve-se ao objetivo maior da LAP que continua sendo a proteção dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, violados justamente por aquelas pessoas que têm o dever de ampará-las e colocá-las a salvo de todo tipo de violência, crueldade e opressão, mormente em sua fase de desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, havendo de lhes ser assegurada essa proteção em condições de liberdade e dignidade. 

Como bem sublinhado por Luzia Márcia da Silva, a Lei 12.318 de 2010 abarca normas instituídas a serem aplicadas em conjunto com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), com a Constituição Federal e com o Código Civil traçando diretrizes relacionadas à Alienação Parental, cujo objetivo é a proteção do menor e a representação de seus direitos fundamentais, em especial a convivência familiar e o cuidado mental e moral. (A Lei de alienação parental como proteção à criança e ao adolescente e aos direitos fundamentais, p. 2. Newsletter Lex Magister, ed. 3456, de 02/10/2019).  

Considerando o campo jurídico, nos seus 14 anos de aplicação a Lei de Alienação Parental demonstrou – e de forma cabal – que tem base e rigor científico, na medida em que, partindo de dispositivos legais previstos tanto no Código Civil, quanto na legislação extraordinária (ECA) vem minimizando as mazelas decorrentes da famigerada alienação parental. Basta para tanto, se examinar o conteúdo de centenas de decisões prolatadas em todos os Tribunais do território brasileiro que solucionaram os conflitos parentais salvaguardando sempre o interesse maior de crianças e adolescentes.  

A jurisprudência colacionada pela imensa literatura nacional que se debruçou sobre o problema da alienação parental comprovou que a aplicação da LAP não só tem minorado os conflitos parentais como, igualmente, tem protegido os interesses maiores de crianças e adolescentes, vítimas da alienação parental, responsabilizando o(a) genitor(a) alienador(a), de modo a garantir um mínimo de normalidade nas tragédias oriundas da ruptura da sociedade conjugal. 

Com a Lei em vigor há mais de uma década, as queixas existentes no pós-ruptura, relativas ao relacionamento paterno-materno-filial ganharam uma nova expressão e passaram a ser examinadas pelo Poder Judiciário com maior acuidade e atenção. O julgador foi compelido a interiorizar a necessidade não só de julgar, ou decidir, mas, especialmente, a apresentar soluções aos dramas familiares que interrompem a sucessão de erros e equívocos, conduzindo as partes a viabilizar o prosseguimento do projeto familiar interrompido, com o mínimo de comprometimento do equilíbrio emocional e da integridade psíquica das crianças. 

A conquista da Lei de Alienação Parental é tão formidável e os efeitos positivos que dela irradiam são tão palpáveis que nenhum movimento, por mais veemente que se apresente, conseguirá apagar sua importância na história do Direito de Família brasileiro.  

E foi sob a diretiva desta perspectiva que o grupo de trabalho da ADFAS se reuniu, analisou, refletiu e apresentou propostas de adaptação da LAP às novas expectativas da sociedade brasileira (em especial a dinâmica indicada pela Lei 13.430, de 18 de maio de 2022), trazendo sugestões e propostas que, mantendo a sistemática fundamental da redação original da Lei de 2010, reforçam a proteção devida a crianças e adolescentes quando vítimas da irresponsabilidade de genitores preocupados com seus interesses egoísticos comprometedores do interesse maior que continua sendo o dos mais vulneráveis e quase sempre menos ouvidos pelo Poder Judiciário.  

Num primeiro momento, lastreado em obras monográficas, capítulos de livros, artigos científicos e produções acadêmicas, o grupo atentou para a redação de todos os dispositivos da LAP, procurando imprimir-lhes perspectiva mais objetiva e tendente a operacionalizar a aplicação das hipóteses ali previstas, sem incidir em detalhamentos que pudessem dificultar a compreensão de um fenômeno eminentemente subjetivo e de difícil materialização em fórmulas rígidas previamente determinadas.  

Com efeito, a dinâmica das famílias é tão multifacetária e tão rica de nuances que o primeiro desafio do legislador implica exatamente em reproduzir na norma os efeitos complexos do pós-ruptura capazes de comprometer o desenvolvimento sadio de crianças e adolescentes.  

Num segundo momento, procurou-se determinar, na redação original da LAP, as eventuais lacunas e imprecisões geradoras de exegeses conflituosas ou contrárias ao escopo fundamental da legislação que continua sendo a proteção de crianças e adolescentes fragilizados pela ruptura do vínculo familiar. Assim, a título de exemplo, o art. 5º e seus parágrafos da redação original, que trata da perícia psicológica ou biopsicossocial, se ressentia de uma melhor precisão capaz de garantir a efetiva contribuição da Psicologia como elemento auxiliar da Justiça.  

Num terceiro momento, procurou-se manter a metodologia empregada pelos redatores do texto original que enfrentou a complexa matéria a partir de três eixos principais sobre os quais repousa a estrutura da LAP, a saber, a caracterização do fenômeno da alienação, a proteção jurídica das vítimas e a inibição de seus efeitos, num organismo homogêneo capaz de atenuar o resultado altamente negativo da prática até então desconsiderada pela ordem jurídica. 

Claro está que alguns ajustes ainda poderão ser feitos na futura tramitação da nova proposta legal, por meio de reflexões abrangentes e profundas, com audiências públicas e debates entre as várias correntes de pensamento a serem realizados em todas as Comissões do Senado que sejam pertinentes à tão relevante temática, de modo a que os nossos legisladores examinem e concluam sobre as alterações de muita relevância para a sociedade brasileira.  

Sob a ótica da vulnerabilidade em que se encontram crianças e adolescentes, a demandar a proteção especial do Estado para garantia de seus direitos fundamentais, a LAP há de ser mantida e novamente aperfeiçoada de modo a não comprometer os resultados altamente positivos já conquistados e plenamente observáveis na sua mais de uma década de aplicação. É fundamental que se incentivem políticas públicas que não só disseminem a informação, mas promovam a reflexão, conscientização e prevenção da alienação parental, mobilizando a família e a sociedade para o bem de todos.  

 

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